O mercado está cada vez mais exigente e imediato, o mundo líquido (Zygmunt Bauman) não permanece mais em seu estado por muito tempo, e nem preciso citar a questão das concorrências. Diante deste cenário complexo, surgem grandes preocupações das lideranças nas organizações. Uma delas é a exigência de uma resposta rápida a todas estas necessidades do mercado e, claro, a adaptação constante frente à velocidade do progresso da tecnologia.
As organizações hoje em dia estão vorazes pela agilidade e transformação digital. A parte de ser modismo já passou, estamos agora falando de “ou muda ou morre!”. A pergunta não é mais quando isso vai ocorrer, agora é “como começo?”.
E aí que está o grande problema: as organizações querem se adaptar – na verdade elas precisam -, e estão investindo em treinamentos para toda equipe de TI sobre scrum, kanban, Less, SAFe, Nexus e mais um monte de ferramentas e frameworks do mercado para “tentar” alcançar a agilidade organizacional desejada.
Conhecer e dominar estas ferramentas ou frameworks é importante, como também saber o que é ser ágil e fazer ágil, não podemos desconsiderar estes conhecimentos e práticas. Com isso os times técnicos (delivery) conseguem alcançar um bom nível de produtividade, contudo, isso fica apenas para aquele time, e o foco permanece apenas nos métodos tornando-os executores dos mesmos, deixando de lado a essência e grande objetivo da agilidade, que é trazer resultado para o negócio, no final o que você tem é apenas um time ágil, mas não a organização.
Vamos alinhar algo: a agilidade foi criada para gerar mais resultado para o negócio, é isso, em alguns momentos acredito que o mercado esquece isso.
Em vários momentos ao iniciar uma consultoria em algumas empresas eu acabo detectando esta disfunção durante o diagnóstico inicial, os times executam frameworks, não focam na entrega de valor para o cliente, e na grande maioria das vezes nem conversam com o cliente, tendo como grande objetivo entregar mais pontos, ou entregar tudo que está no backlog, ou simplesmente realizar o máximo de itens possíveis dentro de duas semanas. Isso não é ser ágil, e claro, não alcança a expectativa do cliente.
Ah, sem contar que isso que falei acima é somente na TI, os outros setores da organização nem sabem o que é ágil, ou seja, você tem um Silo Ágil, parabéns.
Você percebe que há um disfunção e falta de sincronismo quando vê o RH brigando com a contabilidade, a contabilidade brigando com o marketing, o marketing com a TI e assim vai a onda da culpabilidade, onde eu coloco a culpa em quem eu quiser. Mas, o problema é que ninguém assume. Você não vê as pessoas falando em como resolver o problema, mas vê gastando energia em procurar o culpado daquilo ter ocorrido.
A TI fala que está organizada, que é ágil, mas que o PO ou clientes não conseguem entender o que eles fazem e ficam tentando atrapalhar a sprint, neste caso está claro que não há um alinhamento sobre o objetivo estratégico que estão buscando, concluindo que o cliente não foi envolvido no planejamento.
Então vem a grande pergunta: como fazer com que uma organização alcance agilidade em todos os níveis, não somente na TI?
Estou falando de Business Agility, ou, Agilidade Organizacional.
Business Agility é a capacidade da organização se adaptar e flexibilizar para atender às mudanças constantes e necessidades do mercado, entregando valor ao cliente.
Independentemente se estas mudanças são originadas internamente ou externamente, gerando para as organizações um aprendizado rápida e contínuo.
Se a organização puder navegar por estas oportunidades de maneira produtiva e econômica, sem comprometer a qualidade, poderá atravessar qualquer tempestade competitiva.
Business Agility está ligada à estratégia da organização, e não no delivery. Agilidade Organizacional não tem nada a ver com ter times ágeis é mais do que isso.
Um pouco de história. As 3 ondas da agilidade:
1° Onda – Em 2001 veio a primeira onda da agilidade, quando vários profissionais da área de tecnologia, cansados de sofrerem nas mãos dos clientes insatisfeitos, juntaram suas experiências práticas e criaram o manifesto ágil. As equipes de TI começaram a ter resultados com as abordagens ágeis, utilizando como base o manifesto criado (4 valores e 12 princípios).
2° Onda – Em 2007/10 o mercado entendeu que houve uma ampliação das necessidades de agilidade em vários times, que estavam criando o mesmo produto ou atuando de forma integrada e com dependências, foi onde surgiu a visão da escala da agilidade, e apareceram os primeiros frameworks para escalar o ágil, SAFe, Nexus, Kanban (sim, também escala muito bem), Less e etc.
3° Onda – E então em 2016, surgiu o conceito mundial de Business Agility, pois foi percebida a necessidade de levar agilidade para outros setores, devido a necessidade de se envolver outras áreas para entrega de produtos de forma frequente, porque estas entregas não mais dependiam somente da TI. Surgiram então o RH Ágil, Marketing Ágil e outras áreas que precisam entender o que é ser ágil. A grande marca da terceira onda é atualizar a forma como estabelecemos, lideramos e conduzimos as organizações, transformando para uma mentalidade ágil, o que promove uma cultura de rápida aprendizagem organizacional e aplicando práticas ágeis em toda os níveis da organização.
Há uma necessidade de se treinar e preparar as lideranças para ter uma visão mais estratégica e não somente uma visão vertical, onde cada um tem a responsabilidade do seu setor e busca suas metas isoladas, isso não funciona mais.
O comando e controle presente nas organizações tradicionais, também existente em algumas empresas “ágeis”, acaba por trabalhar contra a autonomia, criatividade e capacidade dos times de propor novas soluções, inibindo as pessoas que ficam com medo de se expor. Há também os líderes que além de comandar e controlar cada atividade do time, ainda define as soluções que ele acha ser melhor para o negócio, e isso acaba com o engajamento e motivação dos envolvidos.
As lideranças precisam trabalhar melhor o aspecto de conduzir os times a alcançar sua melhor performance, dando a todos um espaço para criar soluções colaborativas. Necessitam desenvolver habilidades interpessoais relacionadas a comunicação, clareza de objetivos, buscar sempre a melhor solução com apoio de todos, desenvolver os liderados formando novos líderes.
Devemos lembrar que é o cliente no centro, a organização funciona em prol do do mesmo, então precisamos ter obsessão para entregar valor.
Para que a organização possa entender o que ela faz e como ela faz, e assim buscar uma melhoria contínua, precisa ter bem definida a sua cadeia de valor (value stream). Algumas organizações, sequer possuem uma visão ou no mínimo um rascunho da sua cadeia de valor, e quando tem, os profissionais não as conhecem.
Como desejam se tornar ágeis se não conhecem nem mesmo os passos que fabricam seu produto ou realizam seus serviços. Se não tem processo definido ou conhecido, não é possível medir as melhorias e no pior caso, não conseguem nem saber onde melhorar.
Se as organizações não possuem nem os dados mínimos para lhe mostrar onde estão os problemas, como irão definir os planos de ação para aumentar sua capacidade de adaptabilidade ? Mas querem ser mais ágeis colocando frameworks e ferramentas.
Sem números/dados/informações tudo se torna “feeling”, em outras palavras, “achismo”. Por vezes durante o diagnóstico da empresa, chega até a mim que a empresa tem problema de comunicação, eu devolvo, “Como você sabe disso? Como percebeu ? Qual informação você tem que determina a comunicação como um problema?”. Eu pergunto isso porque preciso entender o problema, identificar a origem dele e depois criar ações de melhoria.
Na boa, se você perguntar em qualquer empresa se tem problema de comunicação, qual a chance da resposta ser sempre “sim”? Aí criam o problema da comunicação e utilizam como bengala para tentar explicar vários problemas existentes na empresa. Pergunto de novo: acha mesmo que resolvendo o problema de comunicação nas organizações, resolvemos tudo?
Podemos implantar o melhor processo do mundo, as melhores ferramentas de comunicação existentes no planeta, treinar as pessoas sobre comunicação-não-violenta entre várias outras coisas, mas se o profissional não quiser fazer, ele não fará, ou seja, o foco não pode ser ferramentas e técnicas, mas sim as pessoas.
Precisamos entender as pessoas, a cultura da organização (outra bengala muito utilizada), envolver os profissionais nas decisões, criando um ambiente colaborativo, onde estas possam sugerir soluções, fazer parte para se sentir parte disso.
Agilidade é comportamento, é habilidade, não é ferramenta ou framework, reforço o que disse no início do texto, frameworks e ferramentas são importantes, e aceleram o processo de aprendizado, mas sem o Mindset de agilidade, não serve para nada.
Frequentemente vejo times de “ágeis” , gastando mais energia em saber quantos pontos irão entregar na próxima Sprint, do que conversando com o cliente para entender a sua necessidade e garantir a entrega de valor para ele, isso é surreal.
Ah, ainda tem os times que definem o objetivo da Sprint desta forma: “Objetivo: Entregar todos os itens da sprint.”, tô falando sério. Precisamos definir o objetivo da entrega focada na entrega de valor para meu cliente.
Voltando a agilidade organizacional, não adianta ser ágil na TI se o RH, comercial, contabilidade, marketing não forem. Lembre-se disso:
“Sua empresa é tão ágil quanto seu setor menos ágil”, teoria das restrições.
Business Agility nos traz uma nova forma de transformar a cultura da organização promovendo Agilidade em todos os níveis e setores dela.
Habilita a capacidade de reagir rapidamente às constantes mudanças no mercado assumindo uma condição de liderança, e conduz as organizações no desenvolvimento de uma cultura de melhoria e aprendizagem constante, motivada por pessoas apaixonadas, capacitadas e apoiadas pelas tecnologias mais inovadoras, aumentando assim as chances de sucesso.
Acredito que a verdadeira agilidade só se conquista quando consideramos alguns elementos reais presentes na organização:
Autonomia – As pessoas presentes em todos os níveis da organização com poderes suficientes para tomar decisões, com o foco em testar e aprender de forma rápida, com as competências e habilidades necessárias para uma compreensão clara da estratégia da organização.
Estratégia organizacional – A transparência e disseminação clara e abrangente dos objetivos organizacionais com garantia de compreensão global. Estamos falando de uma estratégia real e não apenas um plano de ação.
Equipes engajadas e seguras – Criação de possíveis soluções para os problemas existentes de forma colaborativa, onde todas as opiniões, mesmo divergentes, são bem vindas e os debates são encorajados, trazendo um ambiente seguro para novas ideias.
Aprendizado rápido e constante – Realização de testes (MVP) com ciclos rápidos de feedback, construindo um novo produto ou serviço com base nas reais necessidades do cliente/mercado, criando um produto de fora para dentro gerando um compromisso real de ser uma organização que aprende.
Lembrando que tudo isso deve envolver todas as áreas da organização e não somente a tecnologia.
Em resumo, para habilitar a Agilidade Organizacional, você precisa do apoio de todas as lideranças, e também desenvolver em seu time as habilidades de uma liderança situacional.
Todos precisam ter a consciência de estar a frente de desafios diários, buscando a melhoria contínua de seus processos e relações entre as áreas.
Todos os times precisam ter o foco nos objetivos estratégicos para que haja um esforço coordenado e integrado para entregar valor ao cliente.
A jornada para alcançar o business agility passa por desenvolver e fortalecer os elementos citados, de forma sincronizada com a Visão, Estratégia e Objetivos de sua organização.
Farei novos artigos explicando como você habilita a Agilidade Organizacional, aguardem.
Agora que você já entendeu um pouco sobre business agility, que tal ler um pouco mais sobre tecnologia?
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Carlos Silva Jr. é especialista em Transformação Digital e Ágil, Business Agility Strategist, atua na área de TI há 23 anos e possui sólida experiência em gestão de projetos de tecnologia e inovação, tendo atuado em grandes empresas de vários portes e segmentos, utilizando gestão ágil e tradicional. Mestre em Gestão de Recursos Humanos e Comportamentos Organizacionais, apoia empresas nos desafios de melhoria de seus processos, definição estratégica e propósito para entrega de valor, com objetivo de alcançar maior produtividade em suas atividades e melhores resultados nas entregas para seus clientes.
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